29/03/2013

Fenômeno da seresta vira morador de rua em Fortaleza


Dos oito anos de idade aos 12, Francisco Jesus Sousa, o “Raí”, era disputado por bares e restaurantes dos municípios de Aquiraz e Eusébio. Os tristes acordes de um violão e a voz possante que exalava romantismo enchiam os bolsos do garoto e alimentavam o sonho de um dia participar de um programa de auditório assistido em todo o Brasil.

Assim como a cada dia o sonho crescia, o menino também avançava na idade. E, em poucos anos, o garoto seresteiro era um homem. “Eu percebi um pouco tarde que a maior atração de meus shows era a minha pouca idade. E, de uma hora para outra, o menino de talento passou a ser visto como aventureiro, como boêmio”, conta Raí, hoje aos 44 anos, morador na praça José de Alencar, no Centro de Fortaleza.

Determinado a resgatar a carreira, o seresteiro chegou a Fortaleza há cerca de dois anos na companhia da esposa, com quem possui cinco filhas. “São quatro do coração e uma da nossa união. Minha esposa é o grande amor da minha vida e as meninas são uma benção. Ela já tinha as quatro meninas quando nos casamos, de papel passado e tudo. Depois veio a caçula para abençoar ainda mais a minha vida”, diz Raí, que há pouco mais de um ano foi abandonado pela mulher.

“Ela conheceu um morador de rua e voltou para Aquiraz, para a nossa casa. Fico preocupado com algumas histórias que ouço, em relação ao tratamento que esse homem dá às minhas filhas. Mas sei que um dia vou dar a volta por cima e orgulhar a minha família. Enquanto isso, Deus guarda a minha esposa e minhas filhas”, afirma o seresteiro, com lágrimas nos olhos.

Sem ver as filhas há mais de um ano e meio, Raí conta que a única visita que recebe é do genro – um jogador de futebol de uma equipe da Segunda Divisão do Campeonato Cearense. “É um rapaz que já jogou em time grande, mas mantém a humildade. Ele me paga almoço e me traz algumas roupas. É um dia muito feliz”, comenta.

Raí conta que o momento mais difícil da sua vida foi ter que pedir esmola pela primeira vez. “Eu estendia a mão para as pessoas, mas o braço tremia. Eu estava muito nervoso. Apesar da fome que sentia, eu chegava a desistir. Eu levantava do chão e caminhava um pouco. Reclamava de mim mesmo: ‘Meu Deus, isso é muita humilhação. Será isso o fim do poço?’. Mas a necessidade foi mais forte. A minha consciência é limpa porque nunca roubei ninguém e nunca usei o dinheiro das esmolas para drogas ou bebidas”.

Enquanto não concretiza o sonho de ser chamado para cantar em um programa de televisão (o seresteiro é fã de Raul Gil), Raí sussurra músicas evangélicas para manequins nas vitrines e pôsteres nas fachadas das lojas. “É o público que tenho hoje”, suspira.



Blog do Eliomar de Lima

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